À luz dos recentes trágicos acontecimentos em Pernambuco e Alagoas, devemos nos perguntar quanto tempo iremos passivamente esperar até que o próximo desastre ocorra para simplesmente implementar protocolos de resposta para minimizar o sofrimento humano Os recentes desastres nos estados de Pernambuco e Alagoas no Norte do Brasil trazem à tona uma indesejada, mas real, ameaça para o país e especialmente para comunidades mais vulneráveis.

Desastres naturais são cíclicos e com enormes impactos para a sociedade. Segundo dados da Defesa Civil Nacional, em Pernambuco, 37 municípios e mais de 50 mil pessoas foram afetadas e em Alagoas, 27 municípios declararam calamidade pública, mais de 38 mil pessoas foram afetadas e oito mortes foram registradas. Não é mais uma surpresa que o Brasil esteja exposto a uma variedade de perigos naturais. A maioria dos eventos naturais recorrentes e interrupções é de natureza hidrometeorológicos tais como seca, chuvas torrenciais e deslizamentos de terra. Enquanto os estados da região Nordeste possuem um histórico de secas com algumas cidades também sendo atingidas por eventos de inundações (mais frequentes durante a última década), o Sul do Brasil é afetado constantemente por eventos climáticos como chuvas torrenciais, vento, granizo, tornados e ciclones tropicais.

Por ser um país de tamanho continental, o Brasil está exposto a uma grande diversidade de eventos naturais extremos que representam um importante desafio para os governos e comunidades. Apesar de um súbito aumento do número e custos dos desastres naturais no Brasil nas últimas décadas, foi somente em 2011, após os eventos catastróficos na região serrana do Rio de Janeiro que provocaram mais de mil mortes, que o governo brasileiro passou a atuar de forma consistente. A seu pedido, o Banco Mundial respondeu prontamente formando uma equipe local para Gestão de Riscos de Desastres (a GRD), em junho de 2011. Foram estabelecidos laços estreitos com as autoridades nacionais e subnacionais, que permitiram avanços significativos na agenda de GRD no país nos últimos seis anos.

Com foco na relação entre os perigos naturais e a exposição de bens a ativos, a equipe do Banco Mundial gerou novos conhecimentos para as autoridades governamentais, bem como vem financiando atividades em inúmeros estados. Como parceiro do governo brasileiro, o Banco tem contribuído para aumentar a capacidade do país tanto para identificar e mitigar riscos de desastres por meio de inúmeros produtos de assistência técnica. No final de 2012, estudos de Avaliação de Perdas e Danos (os DaLAs) após os desastres em Santa Catarina (2008), Pernambuco e Alagoas (2010) e Rio de Janeiro (2011) – com base nas informações disponíveis na ocasião – apontaram para custos estimados somente para esses desastres de R$ 15,3 bilhões: R$ 9,4 bilhões relacionados a danos e R$ 5,9 bilhões corresponderam a estimativa de perdas.

Enquanto os custos foram distribuídos entre o setor privado (48%) e público (52%), o setor público responde por uma parcela maior devido aos custos de reconstrução de propriedades privadas, dado que as habitações de baixa renda foram as mais afetadas nesses desastres. Ainda assim, foi apenas no fim do ano passado que chegamos a uma ampla percepção do quão prejudicial os desastres são para a economia brasileira por meio de um estudo realizado em conjunto entre o Banco Mundial e a Universidade Federal de Santa Catarina. O estudo se concentrou na avaliação da qualidade dos dados e geração de informações de 22.810 relatórios relacionados a eventos de desastres entre os anos de 1995 e 2014. Enquanto o relatório indica que as perdas de desastres no país são da ordem de R$ 800 milhões por mês (ou perto de R$ 183 bilhões no total dos últimos 19 anos), os registros apontam que a frequência e a intensidade dos desastres naturais e as suas perdas associadas vêm aumentando após o ano 2000 e é provável que continuem em ascendência devido ao crescimento desordenado das cidades, a falta de planejamento urbano e as mudanças climáticas.

Com vistas a reduzir as perdas econômicas decorrentes de desastres previsíveis, o Banco Mundial logo percebeu a necessidade de desenvolver uma agenda mais robusta de produtos técnicos estratégicos para o Brasil. Em uma perspectiva estratégica, o primeiro Modelo de Catástrofe (previsão de perdas) foi desenvolvido para o estado de Santa Catarina. De forma a aumentar o campo de conhecimento de Gestão de Riscos de Desastres naquele estado, o estudo teve como objetivo identificar os riscos da exposição de bens e ativos a eventos de inundação e, consequentemente, capacitar o governo estadual e suas instituições para incluir informações práticas de GRD em suas operações diárias e processos de tomada de decisão, respectivamente. Autoridades do governo brasileiro devem concentrar esforços para melhorar suas práticas de GRD e, nesse contexto, o Banco Mundial possui uma ampla gama de experiências bem sucedidas para compartilhar que são possíveis de ser adaptadas a contextos locais específicos, tais como: - Reconstrução sustentável de habitações para situações pós-desastre com foco no aumento da resiliência de um dos setores mais atingidos em situações de desastres no Brasil; - O aumento da capacidade de resposta com base em melhores dados e informações por meio de processos definidos por um grupo temático. - Capitalizar a partir de práticas de planejamento urbano.

À luz dos recentes trágicos acontecimentos em Pernambuco e Alagoas, levando em conta a capacidade desenvolvida desde 2011, devemos nos perguntar quão breves devemos agir para atenuar os riscos de desastres ou quanto tempo iremos passivamente esperar até que o próximo desastre ocorra para simplesmente implementar protocolos de resposta para minimizar o sofrimento humano? Frederico Pedroso é doutor em engenharia civil pela Universidade de Canterbury, na Nova Zelândia e é especialista em gestão de riscos de desastres no Banco Mundial. Niels Holm-Nielsen passou pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e atualmente é especialista em gestão de riscos de desastres no Banco Mundial.

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